No mês de agosto tive a chance de ler O Retrato de Dorian Gray na leitura conjunta organizada pela Mell Ferraz do Literature-se, e tive mais uma experiência incrível. Adquiri a edição da Biblioteca Azul, que apresenta o texto original sem censura da obra. Talvez você não saiba, mas este livro foi responsável por muitas desgraças na vida do Oscar Wilde - ele foi usado como prova de "indecência", o que era crime na época. Se tornou conhecimento geral que Wilde mantinha relações com outros homens, e o livro é visto como uma representação disto nas relações entre os personagens.
O autor revisou a obra após toda a sua repercussão e outras versões foram lançadas, inclusive uma a qual ele adicionou mais 7 capítulos. Na edição que li há algumas notas que explicam alterações feitas tanto pelo próprio autor quanto também pelo editor responsável pela publicação da obra. Mas vamos lá falar mais sobre esse enredo!SINOPSE
Nesta edição, Nicholas Frankel, organizador e autor das introduções e das notas, reconstitui o romance a partir do original datilografado ― ou seja, eliminando toda a censura que o livro sofreu até que chegasse ao público, e constrói pela primeira vez a versão que Wilde gostaria que estivéssemos lendo hoje.
Essa espécie de mito de Fausto tornou-se um clássico da literatura mundial pelo refinamento da escrita e pela universalidade do tema. Com uma destreza de estilo ímpar, Wilde cria frases lapidares com um humor ácido e um olhar astuto, criticando ferrenhamente a hipocrisia de uma sociedade que passava por transformações muito rápidas.
A obra parte de um cenário vitoriano, na Inglaterra do século XIX. Basil é um pintor em ascensão que, logo no início do livro, apresenta ao seu amigo Henry o belo rapaz Dorian Gray, a quem ele conheceu há pouco tempo e que concordou em posar para o seu mais novo quadro. De cara percebemos que Henry será de grande influência na vida de Dorian, pois os dois criam uma interessante conexão, e o Basil nem queria que a dupla se conhecesse, pois previa que a amizade poderia levar a caminhos sórdidos.
Vocês pintores são mesmo muito estranhos! Fazem qualquer coisa no mundo para ganhar fama. Tão logo a conseguem, dão a impressão de que querem jogá-la fora. Isso é uma bobagem sua, porque só há uma coisa no mundo pior do que ser falado: é não ser falado." p. 75
Henry discursa para Dorian sobre como sua beleza está ameaçada pelo tempo, e ao ver o quadro com a sua imagem pronto e perfeito, Dorian acaba fazendo o famigerado pacto fáustico ao afirmar que daria tudo para se manter eternamente belo enquanto só o quadro sofreria as consequências da vida e da idade. O tempo passa e as vidas dos personagens seguem em frente, mas as tragédias parecem perseguir Dorian, que se mantém tão belo quanto antes.
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De início Dorian aparece como um jovem inexperiente, mas logo vemos que Henry desperta nele o seu lado mais perverso e que, na minha opinião, já morava em seu íntimo. Henry funciona então quase que como uma figura diabólica, que está sempre buscando exercer influência sobre as pessoas e exagera no uso de frases de efeito. Enquanto isso, Basil é uma espécie de moderador, sendo um tanto mais sensato; a não ser quando consideramos a sua idolatria por Dorian, que acaba se mostrando também prejudicial e lhe atribui uma parcela de culpa.
Porque influenciar uma pessoa é lhe dar nossa própria alma. Ela deixa de pensar seus pensamentos naturais ou arder com suas paixões naturais. Suas virtudes não são reais para ela. Seus pecados, se é que existe tal coisa, são tomados por empréstimo. Torna-se o eco da música de outrem, desempenhando um papel que não foi escrito para ela." p. 107
As referências à homo afetividade no livro são sutis, mas interessantes de se observar em meio à simbologia utilizada pelo autor. É nesse ponto que as notas de rodapé se tornam importantes, pois muitos elementos são explicados sob a óptica de pesquisas posteriores a respeito da obra de Oscar Wilde. Entretanto, como citei em um post anterior, senti que essa edição da Biblioteca Azul se excedeu nas notas, que muitas vezes trazem adendos desnecessários.
Nessa época vários assuntos eram censurados as vezes sem ter algo explícito mas só pelo fato de passar a ideia, o que é muito triste pois pra mim as coisas servem como aprendizado e estudo. Eu não gosto de livros que tenham temas clássicos mas quem gosta, vai gostar desse livro só pela sua resenha.
ResponderExcluirKisu,
Jaque de Lua 🎔
Eu não conheço essa edição, mas esse livro (editora pinguim, que eu adoro) já foi item essencial no meu criado-mudo. Acho intrigante como é atual em pleno século XXI e depois de tantas discussões. Às vezes, parece que nada aconteceu e ainda estamos no tempo do autor, como se ele estivesse a escreve o livro, pontuando a hipocrisia, corrupção e falsidade da imagem. Sei lá, observando as pessoas e a dificuldade em envelhecer parece que o retrato do livro ganhou vida.
ResponderExcluirEu não considero esse livro um clássico (mas é porque eu tenho birra com esse rótulo) para mim é um livro necessário e clássicos para mim, geralmente são aqueles que, como você disse, a gente lê por obrigação ou imposição. rs
Adorei a resenha e amei relembrar Dorian.
bacio
Clássicos para mim são livros que são atemporais, você pode ler em 1920 e em 2030 que continuará atual.
ExcluirAh, eu amo esse livro, já li e reli diversas vezes e também assisti filmes, é uma história impactante que mantém seu fascínio através dos tempos. Também fiquei curiosa com a edição que traz mais capítulos, não sabia que existia.
ResponderExcluirEsse livro é incrível e, como você disse, nem parece clássico de tão bem que a leitura flui. Fiquei curiosa por essa edição sem censura!
ResponderExcluirAbraços
O Retrato de Dorian Gray está na minha lista de leituras futuras tem um tempinho, a premissa da história sempre me interessou. Mas sua resenha me deixou ainda mais curiosa, não sabia que o livro tinha sido censurado e muito menos dos transtornos que trouxe para a vida de Oscar Wilde. Acho que saber disso, ter mais informações sobre o contexto que envolve a obra, enriquece muito a leitura. E estou de olho nessa edição, justamente por conter os trechos censurados e incluir notas de rodapé. Dica anotada!
ResponderExcluirMenina, quantas polêmicas devastadoras uma obra pode causar, não é? Me lembro dessas repercussões e imagino o caos que tenho vivido Oscar Wilde. Um clássico sem muitas enrolações, como você bem diz, direto ao ponto, mesmo quando ele capricha nas descrições. Gostei!
ResponderExcluirSua resenha é de um primor fabuloso a nos conduzir. Imagino ter sido ainda uma ótima experiência Literária com o grupo da Mel Ferraz! Grande beijo!
Tentaram censurar o livro, mas esqueceram que a literatura nunca irá desabar em nenhum momento. Fiquei muito feliz em saber sobre esse livro e a história! <3
ResponderExcluirGostei e aprendi muito com o texto, quero explorar este livro por outra abordagem que é sobre a visão narcisica do mundo Vitoriano e pós vitoriano. Parabéns!
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