A Vegetariana (Han Kang)

Este livro chamou a minha atenção desde que foi lançado no Brasil pela Editora Todavia. O motivo eu não sei bem; talvez seja o nome, talvez a capa. O fato de ser escrito por uma autora coreana também me deixou curiosa, pois nunca havia lido nada do país. Após me encantar com esses elementos, o livro já foi para a minha lista de desejos sem nem mesmo eu ter lido a sinopse, e desde então eu só lia elogios sobre ele. E como se o clube Garimpo e a curadora Mell Ferraz ouvissem o meu clamor, acabei recebendo a obra em agosto através do clube escritoras.

capa a vegetariana

Foi uma leitura intrigante. A obra é curta, com apenas 171 páginas, mas carrega um peso em sua escrita que me causou certo estranhamento de início. A narrativa reúne mais de um relato e pontos de vista, e o primeiro é o do marido da protagonista, em primeira pessoa. Yeonghye é descrita como uma mulher medíocre, com nenhuma característica surpreendente e comportamentos normais, nunca impróprios. Casada e sem filhos, faz parte de uma família que se torna parte da história: possui uma irmã casada e um sobrinho, e é filha de um casal de coreanos que eu consideraria conservador.
Tudo começa a mudar quando Yeonghye toma a decisão de parar de comer carne. Os motivos não são os que normalmente inspiram outras pessoas a se tornarem vegetarianos; são os seus sonhos, relatados em pedaços no livro, que a fizeram seguir esse caminho.

livro a vegetariana

SINOPSE

“…Eu tive um sonho”, diz Yeonghye, e desse sonho de sangue e escuros bosques nasce uma recusa vista como radical: deixar de comer, cozinhar e servir carne. É o primeiro estágio de um desapego em três atos, um caminho muito particular de transcendência destrutiva que parece infectar todos aqueles que estão próximos da protagonista. A vegetariana conta a história dessa mulher comum que, pela simples decisão de não comer mais carne, transforma uma vida aparentemente sem maiores atrativos em um pesadelo perturbador e transgressivo. Narrado a três vozes, o romance apresenta o distanciamento progressivo da condição humana de uma mulher que decidiu deixar de ser aquilo que marido e família a pressionaram a ser a vida inteira. Este romance de Han Kang tem sido apontado como um dos livros mais importantes da ficção contemporânea. Uma história sobre rebelião, tabu, violência e erotismo escrita com a clareza atordoante das melhores e mais aterradoras fábulas.


livro a vegetariana

Este não é um livro sobre vegetarianismo. Como descrito em seu verso, é um romance sobre rebelião, tabu, violência e erotismo, e eu diria que é também sobre loucura, em certa medida. É perturbador quando nos colocamos no lugar da protagonista, atormentada diariamente por pesadelos viscerais que a deixaram incapaz de consumir carne. O livro transmite tudo isso não só na descrição dos sonhos, mas dos sentimentos que eles trazem, nas atitudes que a personagem toma, e se torna perturbador ainda pelo que tudo isso causa a outras pessoas que rodeiam Yeonghye. Em certo ponto a decisão dela se torna ainda mais radical, mas os detalhes disso eu deixo para vocês descobrirem com a leitura.

a vegetariana

Em um segundo momento, temos a narrativa guiada pelo cunhado de Yeonghye, mas em terceira pessoa. Ele é um homem peculiar, que trabalha com arte e tem algumas ideias não muito convencionais que busca colocar em prática no seu trabalho. O contato que ele tem com a protagonista me trouxe uma impressão de sua "loucura" ser contagiosa (não no sentido de deixar de comer carne, mas na forma como ela passou a encarar a realidade)
De repente ficou enjoado. O ódio, a desilusão e o sofrimento que aquelas cenas lhe causavam, as intermináveis horas que ele passava olhando para elas, para então chegar ao fundo desses sentimentos, apareciam em sua mente como uma espécie de autoviolência. No auge da agonia, pensou em abrir a porta do táxi, que ia em alta velocidade, e se atirar no asfalto. Não conseguia mais suportar aquelas imagens da realidade. " p. 68
A questão é que os sonhos de Yonghye a mudaram completamente. No começo as mudanças são sutis: após parar de comer carne, ela deixa de usar sutiã; após um tempo, passa a andar nua pela casa. Mas isso é apenas um começo parece ser um esvaziamento de sua humanidade. Nada mais importa, a não ser a necessidade de se ver longe de carne. Aos poucos ela vai se transformando, e sua relação com as pessoas a sua volta não tem mais valor algum. Sua família não encara isso muito bem: todos tentam forçá-la a comer carne, até mesmo de forma violenta. 

a vegetariana

A terceira e última parte da obra mostra o ponto de vista da irmã de Yeonghye, em terceira pessoa. Essa foi para mim a parte mais forte e sentimental do livro. Não quero trazer muitos detalhes por se tratar do desfecho da história; só digo que fiquei impactada com todos os acontecimentos.
De repente, se deu conta de que nunca tinha vivido e ficou surpresa. Era verdade. Não tinha vivido de fato. Desde o tempo remoto da infância, tudo o que ela fizera foi aguentar." p. 153
Apesar de não ter como foco a sociedade coreana em si, eu senti várias diferenças culturais. Acredito que o comportamento dos personagens diz muito sobre a postura que homens e mulheres assumem no país, o que me deixou bastante pensativa.

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autora a vegetariana

A escrita de Han Kang me agradou muito. Apesar de toda a loucura, de toda a confusão que essa história traz, ela conseguiu escrever isso de forma fluída e com diálogos muito interessantes. Com suas poucas páginas A vegetariana conseguiu deixar sua marca, sendo inclusive vencedor do Man Booker International Prize. Fiquei curiosa para ler mais de seu trabalho.


ISBN: 978-85-88808-28-7
Editora: Todavia
Nota: 4/5⭐

8 Comentários

  1. Caramba muito louco isso, fiquei curioso pra ver um pouco da loucura do cunhado também, e como não só ele foi afetado por essa decisão dela. Quero ler para saber como termina!

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  2. Eu também nunca li nenhum livro de uma autora coreana, mas confesso que fiquei curiosa com essa história e já está na miinha listinha de 2020!!

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  3. Olá! Não conhecia esse livro mas, gostei da temática e gostei do seu ponto de vista. Acho que a história pode ser pesada e construtiva ao longo do livro. Não sei se ainda é a vibe para eu ler no momento mas, com toda a questão do vegetarianismo eu considero passar vários dias sem comer carne, mas no momento ser vegetariana ainda não.
    Beijocas.

    https://www.parafraseandocomvanessa.com.br/

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  4. Simplesmente AMEI! Já até comprei o ebook pra ler!
    A resenha ficou linda! E as fotos... aiaiai, perfeitas! Também amei seu blog.
    Logo assim que terminar de ler venho falar mais sobre o que achei do livro e trocar figurinhas literárias, haha.

    Abraços,

    Julia.

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  5. Oi, Malu! Tudo bom?
    Antes de tudo, eu queria parabenizar imensamente a escrita impecável dessa resenha que me deixou com uma vontade inexplicável de conhecer essa obra. Todos os elementos, do projeto gráfico ao enredo, gritaram por mim. Acho que você deve entender o que quero dizer, porque deve ser um tanto semelhante com o sentimento que descreveu no início da postagem.
    Abraços,
    Literalize-se

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  6. É uma leitura muito diferente. Eu fiquei impactada com a sua resenha, imagine o livro.
    Eu li com afinco porque é inacreditável o enredo hahaha
    Nota 4/5, é uma nota excelente!
    Adoro ler resenhas assim, justamente porque é um livro que eu não compraria, então como eu saberia que ele é tão interessante?! haha
    Adorei ♥

    www.ultimobiscoito.com.br

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  7. Parece ser uma história muito intensa, fiquei agoniada só de pensar na personagem sendo forçada a comer carne, mas me interessei muito pelo livro, na verdade, ele já estava na minha wishlist à alguns meses.
    Amei sus resenha, ficou super completa e interessante! :)

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  8. Meu Deus sua resenha ficou MARAVILHOSA! É como se o post fosse um elogio pra autora, sabe? Fez jus a todas as características incríveis que ressaltou dele... Fiquei curiosa com essa migração de ponto de vista com narrações tão diferentes indo da primeira pra terceira pessoa, me parece ousado da parte dela e ainda assim funcional!

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